Na política a margem é curta, mas na matemática são várias as geometrias que podem levar à aprovação do Orçamento. O PCP, quando parecia de fora pelo tom das críticas e pela aproximação das autárquicas, tornou-se, afinal, o parceiro favorito nas negociações. O Bloco de Esquerda passou em poucos dias de negociador-mor a partido que admite votar contra o Orçamento se o Governo não garantir, através de um compromisso escrito, avanços em áreas-chave até à votação na generalidade, a 28 de outubro. E sem o Bloco garantido, o PAN tornou-se determinante uma vez que — mesmo com abstenção do PCP e do PEV — o Governo precisa ainda dos deputados do partido liderado por André Silva para que o documento seja viabilizado.
O PSD, bem como os partidos à sua direita, está fora da equação, embora Rui Rio tenha sofrido pressões ao mais alto nível — do Presidente da República — para ser uma espécie de salvaguarda caso as negociações à esquerda não corressem bem.
À parte da dramatização dos últimos meses, tudo indica que a geringonça vai voltar a funcionar, mesmo que um dos parceiros se retire. Costa está, aliás, confiante de que o Orçamento será aprovado. Certo é que o Governo está a fazer tudo para acomodar as propostas dos parceiros de esquerda de forma a reduzir a margem para um chumbo. Na matemática pura, as contas são mais lineares, mas há múltiplos cenários. Uns mais prováveis do que outros. A primeira votação, na generalidade, é já a 28 de outubro, a final será a 26 de novembro.
Apesar dos dramas dos últimos meses, dos ultimatos das últimas semanas e do PCP ter mesmo votado contra o orçamento suplementar há três meses — no primeiro voto contra de um parceiro de "geringonça" desde novembro de 2015 — continua a ser um cenário possível que PCP, PEV, Bloco de Esquerda e PAN se abstenham, embora nenhum deles tenha dado essa garantia inequívoca e o Bloco dê agora sinais de que é bem possível roer a corda. Desde 2015 a "geringonça" entendeu-se sempre que necessário — temendo a repetição do chumbo PEC IV, que conduziu Pedro Passos Coelho ao poder — para que a estabilidade governativa não fosse colocada em causa.
Nos orçamentos do Estado de 2016, 2017, 2018 e 2019 — todos da 'era Costa' na anterior legislatura — só o PSD sozinho tinha mais deputados do que o PS, o que tornava necessário os parceiros de esquerda votarem a favor do documento. E foi isso que fizeram: o OE de 2016 foi aprovado com os votos favoráveis de BE, PCP e PEV e nos três anos seguintes o PAN juntou-se. Com as novas combinações aritméticas que saíram das legislativas de setembro de 2019, deixou de ser necessário os partidos à esquerda do PS votarem a favor. Bastava absterem-se para o documento passar. E foi isso que aconteceu no Orçamento para 2020. No suplementar, o PCP ainda votou a contra, mas aí não queria estar no mesmo rol do PSD (que viabilizou com o BE o documento, por via da abstenção). Agora que o Bloco parece estar a colocar-se de fora, são os comunistas que voltam a entrar em campo.
Source: observador.pt
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